O cuidado com a temperatura na conservação de alimentos
frescos e perecíveis como a carne é a principal dica de especialistas para os
consumidores após a deflagração da Operação Carne Fraca, pela Polícia Federal,
na última sexta-feira (17). Doutor em Tecnologia de Alimentos, o professor da
Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp,(Universidade de Campinas),
Sérgio Pflanzer, afirma que os conservantes utilizados pelas indústrias da
carne, mencionados nos relatórios da Polícia Federal, são autorizados pelas
autoridades sanitárias brasileiras e não são capazes de modificar a essência
dos produtos.
Apesar de sugerir recomendações aos consumidores
sobre o aspecto dos alimentos, a Proteste - Associação de Consumidores - adotou
uma posição mais rigorosa: orienta os cidadãos a não comprarem produtos das
empresas envolvidas nas irregularidades. A operação da Polícia Federal bloqueou
R$ 1 bilhão de empresas suspeitas de subornar fiscais para que carnes vencidas
fossem reembaladas e liberadas para comercialização.
Algumas das maiores empresas do ramo alimentício
do país estão na mira das investigações, entre as quais a JBS, dona do Big
Frango e Seara, e a BRF, detentora das marcas Sadia e Perdigão.
“Foi falado em alguns momentos que a indústria
maquiava a carne para comercializar. Essa é uma interpretação errada, no meu
entendimento. Com as substâncias aprovadas, isso não é possível. Você não
consegue utilizar [aditivos] para mascarar uma carne deteriorada. Visualmente,
quando você adiciona algum produto, a carne fica pior do que estava antes”,
explicou o professor Sérgio Pflanzer, mencionando conservantes como nitrito,
fosfato e os ácidos sórbico e ascórbico [vitamina C]. “Nenhuma dessas
substâncias aprovadas consegue mascarar uma carne fresca deteriorada”, afirma.
Anvisa
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), segundo o especialista, aprova a utilização dos produtos, a maioria
com um limite máximo permitido. “Se eu usar em excesso, o produto vai ficar
caro, porque os ingredientes são caros, e vão desenvolver características
indesejáveis ao produto. Se eu colocar demais, por exemplo, o ácido ascórbico,
que foi falado muito nos últimos dias, a percepção sensorial vai ficar
comprometida. O consumidor estará seguro, ela não causa mal, mas ninguém vai
conseguir consumir o produto, então a indústria não vai fazer isso”, argumenta.
Já a temperatura, de acordo com Sérgio, precisa
de um “controle rigoroso”, tanto na aquisição por frigoríficos como no
armazenamento em supermercados e açougues. O professor alerta, contudo, para a
importância dos fiscais agropecuários ao analisar as características de
refrigeração e de validade da carne.
“Cabe à fiscalização liberar ou não. Não é porque
chegou um carregamento que deveria estar armazenado a 7ºC e estava a 8ºC [que
obrigatoriamente deve ser descartado]. Existem outros dados que indicam que a
carne não pode ser comercializada, como a cor e o aroma”, avalia. No caso de
alguma carne vencida, Sérgio explica que o congelamento inibe o crescimento de
bactérias, o que pode manter a segurança do alimento.
“Ela deveria também ser descartada, mas se for
utilizada, não vai oferecer risco. Na maioria dos casos, eles não são
autorizados. Mas dependendo da condição, o fiscal pode liberar. Cabe a ele
avaliar lote a lote, peça por peça, se podem ser utilizados”, sugeriu.
Não recomendado
Segundo Sonia Amaro, advogada e representante da
Proteste, o posicionamento da entidade é que os consumidores deixem de comprar
carnes que têm como origem os frigoríficos alvo da operação. Ela explica que a
orientação tem como objetivo evitar malefícios à saúde dos consumidores, que,
como leigos no assunto, não têm condições de garantir a qualidade dos produtos.
“Com tudo que foi divulgado nessa operação, o
nosso posicionamento, diante da gravidade do assunto, é dizer para o
consumidor: não compre produtos dessas empresas. O consumidor, que é a parte
vulnerável, não pode ter a certeza de que a carne não vai fazer mal à sua
saúde. Como ele vai se proteger? Não tem como. Por isso, a Proteste adotou essa
postura”, disse Sonia.
Cuidados
Apesar da contraindicação, Sonia e o professor de
Qualidade de Carne dão dicas gerais para o consumidor ficar atento na hora de
ir ao supermercado. Para as peças vendidas em bandejas de isopor e embaladas
com plástico, a atenção à cor e ao aroma são as principais orientações. Em
geral, alertam os especialistas, o prazo de conservação aceitável desse tipo de
alimentos em refrigeradores é de no máximo três dias.
“Como entidades de proteção ao consumidor, nós
sempre recomendamos que seja observada minimamente a higiene do local. Checar
se os funcionários que estão em contato com alimento usam luvas e toucas. Em
segundo lugar, o aspecto do produto, verificar se a embalagem não está violada,
e o cheiro do alimento”, aconselha Sonia Amaro.
A representante do Proteste sugere também que os
consumidores analisem se não há água escorrendo dos refrigeradores, porque isso
pode ser um sinal de que foram desligados à noite. A preferência por carnes que
possuem embalagens originais também é recomendada, pois nelas é possível saber
a origem do produto e se ele possui selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF).
“Essa é a maior garantia de que a carne foi
inspecionada. Vamos imaginar que, quase na totalidade, o sistema funciona muito
bem, salvo algumas exceções que a Polícia Federal mostrou que existem falhas de
fiscalização. São pontuais, mas existem. Então, a gente parte do princípio de
que o serviço de inspeção federal é o melhor. Depois, a gente tem o estadual, o
municipal, que sou honesto em dizer que nem sempre funciona da mesma maneira”,
finaliza o professor.
Ag. Brasil
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